Terror, sequestros, invasão de TV, toque de recolher: entenda a onda de violência no Equador
A crise de segurança que atinge o Equador tomou novas proporções nesta terça-feira (9), quando uma universidade em Guaiaquil e uma emissora de TV local foram invadidas por homens armados com revólveres e bombas.
Em meio a esses ataques, um brasileiro foi sequestrado, assim como sete policiais, houve explosões na província de Esmeraldas, e o Ministério da Educação suspendeu as aulas presenciais em todo o país até a próxima sexta-feira (12).
Os ataques acontecem dois dias após a fuga do líder dos Los Choneros, uma das facções criminosas mais temidas do país, da prisão onde cumpria uma pena de 34 anos.
A crise no Equador, que começou com motins em prisões, faz parte de uma onda de violência que vem tomando conta do país desde agosto de 2023, quando a eleição presidencial que deveria ocorrer apenas em 2025 foi antecipada após a dissolução da Assembleia Nacional.
Em agosto, às vésperas da votação, Fernando Villavicencio, um dos candidatos à presidência, foi morto a tiros à luz do dia ao sair de um comício.
O que aconteceu agora?
Após a fuga de José Adolfo Macías Villamar, conhecido como Fito, chefe de facção criminosa, da prisão, no último domingo (7), o governo do Equador decretou estado de exceção.
Dois dias depois, homens armados invadiram uma universidade e os estúdios do canal de TV estatal TC Televisión, na cidade de Guayaquil, ao vivo, mantiveram pessoas como reféns e um dos invasores chegou a encostar uma arma no pescoço de um apresentador.
Cerca de duas horas depois do ataque, a Polícia Nacional do Equador afirmou em na rede social X (Twitter) que controlou a situação, capturou 13 pessoas que invadiram os estúdios e “estabeleceu a ordem”.
O presidente Daniel Noboa declarou 22 grupos como terroristas.
Paralelamente à invasão, o Ministério das Relações Exteriores acompanha uma denúncia de sequestro de um brasileiro no Equador. (Assista ao vídeo abaixo).
Gustavo, filho de Thiago Allan Freitas, afirmou, em vídeo nas redes sociais, que a família pagou parte do resgate e está desesperada por não ter o restante do dinheiro
O Itamaraty afirmou que mantém contato com os familiares e “busca apurar as circunstâncias do ocorrido junto às autoridades locais”.
O que é estado de exceção?
O estado de exceção no Equador permite que as Forças Armadas vão às ruas apoiar o trabalho da polícia. O decreto é justificado pela grave comoção interna no país. O estado de exceção tem vigência de 60 dias. Nesse período, estão restritos os seguintes direitos no Equador:
- Direito de locomoção, há toque de recolher entre as 23h e as 5h.
- Direito de reunião.
- Direito a privacidade de domicílio e de correspondência (ou seja, não é preciso uma ordem judicial para que as autoridades entrem nas casas das pessoas).
Noboa está no cargo há menos de dois meses. Essa é a primeira vez que o presidente decretou estado de exceção.
O que é o decreto de ‘conflito armado interno’?
Com a escalada da violência, Noboa também estabeleceu nesta terça-feira (9) o decreto de conflito armado, que autoriza a intervenção do Exército e da Polícia Nacional no país contra facções criminosas, e ainda:
- Identifica como organizações terroristas 22 facções criminosas e “atores beligerantes não estatais”;
- Determina às Forças Armadas a execução de operações militares para “neutralizar” os grupos criminosos, “respeitando os direitos humanos”.
Onde fica o Equador?
Vizinho de Colômbia e Peru, o Equador é um dos dois únicos países da América do Sul que não fazem fronteira com o Brasil — o outro é o Chile.
O país foi batizado com o mesmo nome da linha imaginária que corta o planeta ao meio entre os hemisférios Norte e Sul. É banhado pelo oceano Pacífico, tem Quito como capital e o espanhol como língua oficial.
O país tem 18 milhões de habitantes, segundo a ONU, menos que todo o estado de Minas Gerais (20.5 milhões) e que a população da Grande São Paulo (cerca de 20 milhões).
O Equador é violento?
O tema insegurança foi o mais citado em uma pesquisa feita pelo instituto AS/COA em julho de 2023, que perguntou aos eleitores o que eles consideravam mais importante na hora de escolher um candidato.
A taxa de homicídios no país em 2022 chegou a 25 mortes a cada 100 mil habitantes. O número é bem maior que a média de homicídios no mundo. Relatório da ONU de 2017 estimava uma média mundial de 6,1 mortos para cada 100 mil habitantes. O Brasil, considerado um país violento, teve média de 23,4 mortes por 100 mil habitantes em 2022.
O cientista político Maurício Santoro, em entrevista à GloboNews, disse que essa onda de violência gerou uma influência na política do Equador.
“O país se tornou uma rota muito importante para o tráfico de drogas na América Latina, que entra pelos portos equatorianos, atravessa a Amazônia e vai para a Europa e os Estados Unidos”, disse ele.
Também à GloboNews, Tanguy Baghdadi, professor de Relações Internacionais, falou sobre o avanço das milícias no Equador frente ao aumento da sensação de insegurança.
“O Equador passou recentemente por um processo de elevação muito grande da quantidade de pessoas [mortas] por cem mil mortos. […] A ponto de o então presidente, Guilherme Lasso, ter dado autorização, por exemplo, para que civis tomassem conta dos seus próprios bairros, o que é muito contestado dentro da própria política equatoriana, mas dá uma demonstração do nível de insegurança pelo qual os equatorianos passam.”
“E a gente sabe muito bem qual é o nome disso. Isso que o Guilherme Lasso autorizou, o nome disso é milícia. [É] você criar, portanto, milícias armadas para proteger sua própria vizinhança, uma vez que o poder público é incapaz de fazê-lo. Obviamente isso acaba tendo um impacto muito grande sobre duas classes: sobre a classe dos políticos e sobre a classe dos jornalistas. E o Fernando Villavicencio calhou de ser os dois.”
Fonte: g1.globo.com